Brasil investe em prevenção e combate ao crack

Campanhas preventivas e educacionais tentam conter experimentação de entorpecentes.



Por Cristine Pires 



PORTO ALEGRE, Brasil – João Vitor tem apenas 11 anos e já sabe de todos os perigos que as drogas causam.
Desde pequeno, o menino é alertado pelos pais sobre o mal que os entorpecentes trazem ao usuário e à família.
“Falamos de tudo, do cigarro e do álcool até a questão de drogas ilícitas”, conta a mãe de João Vitor, a auxiliar administrativo-financeira Daisy Correa Menezes, 32 anos. “Ele é bem ciente e pergunta bastante. Temos conversas abertas justamente para que o nosso filho conheça os riscos e fique longe das drogas.”
A socióloga Vanessa Gil, 31, concorda que a conversa franca é a estratégia mais eficiente para manter crianças e adolescentes longe dos narcóticos.
Lucas, 15 anos, filho de Vanessa, não apenas recebe orientações sobre os malefícios dos entorpecentes, como convive na família com um ex-usuário de cocaína ainda em tratamento.
“Esse assunto está em pauta toda hora na nossa casa”, diz Vanessa. “Procuro explicar para o Lucas o que cada droga causa. Ele sabe que, se usar, terá que enfrentar os perigos da dependência e tudo que ela representa.”
A fórmula adotada por Daisy e Vanessa para prevenir a experimentação de drogas ilícitas também é a bandeira de uma das mais recentes iniciativas contra entorpecentes no Brasil.

       Uma cartilha, cuja capa está reproduzida nessa ilustração, com respostas a 10 dúvidas sobre o consumo de crack é uma das principais estratégias da campanha Crack nem pensar. Ao todo, 10.000 exemplares foram distribuídos aos tribunais de todo o Brasil.(Reprodução)
Uma cartilha, cuja capa está reproduzida nessa ilustração, com respostas a 10 dúvidas sobre o consumo de crack é uma das principais estratégias da campanha Crack nem pensar. Ao todo, 10.000 exemplares foram distribuídos aos tribunais de todo o Brasil.(Reprodução)
Lançada no final de junho pelo Conselho Nacional de Justiça, a campanha nacional Crack nem pensar quer alertar sobre todos os danos que a pedra de cocaína pode causar.
Uma cartilha com respostas a 10 dúvidas sobre o consumo de crack é uma das principais estratégias da iniciativa. Ao todo, 10.000 exemplares foram distribuídos aos tribunais do país.
“A ideia da cartilha surgiu da necessidade de prevenção, identificada no trabalho dos juízes, profissionais que precisam estar munidos de informações, pois lidam direto com a questão das drogas”, explica Daniel Issler, juiz auxiliar da presidência do CNJ e integrante do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do conselho.
Disponível no site do CNJ, a cartilha está sendo encaminhada para os grupos de monitoramento carcerário e coordenadorias de infância e juventude dos tribunais.
“O retorno tem sido muito positivo”, afirma Issler. “A prevenção é a saída. Precisamos mostrar que o crack é devastador.”
Esforço do Plano de Enfrentamento reúne diversas áreas
Desde maio de 2010, o governo federal trabalha com o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras drogas. A meta é prevenção do uso, oferta de tratamento a dependentes, reinserção social de usuários e enfrentamento ao tráfico de drogas, principalmente nas regiões de fronteira.
Ao todo, o governo federal destinou R$ 410 milhões para quatro órgãos federais que atuam no plano:
  • R$ 120 milhões para o Ministério da Justiça
  • R$ 100 milhões para o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
  • R$ 100 milhões para a Secretaria Nacional Antidrogas
  • R$ 90 milhões para o Ministério da Saúde.
Dos R$ 90 milhões do Ministério da Saúde, quase R$ 70 milhões foram aplicados até julho desse ano na ampliação da assistência direta à saúde de usuários de crack e outras drogas e na capacitação de profissionais de saúde que atuam nesse segmento.
A assistência aos dependentes químicos é prestada com terapia ocupacional nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), Consultórios de Rua e Casas de Acolhimento Transitório (CATs). Tratamento medicamentoso e internação também são adotados se necessário, segundo o Ministério da Saúde.
Em 2010, somente nos 1.650 CAPs espalhados pelo país, foram realizados 21 milhões de atendimentos ambulatoriais em saúde mental – 50 vezes mais que em 2002, quando foram realizados 423.000 procedimentos.
Os CAPs infantis de acompanhamento intensivo, que atendiam 3.014 crianças e adolescentes em 2002, atenderam 328.302 em 2010.
Nos CAPs de acompanhamento semi-intensivo, o volume saltou de 7.003 atendimentos em 2002 para 694.817 procedimentos em 2010.
Tratamento precisa ser eficaz
Acostumado a receber usuários de drogas nos CAPs onde trabalha no estado de São Paulo, o médico Flávio Falcone diz que a principal dificuldade é fazer o usuário aderir ao tratamento.
“Um dos grandes problemas que ocorrem nos tratamentos convencionais está na baixa taxa de adesão dos usuários ao tratamento”, afirma.

       Daniel Issler, juiz auxiliar da presidência do CNJ: “A prevenção é a saída. Precisamos mostrar que o crack é devastador”. (Cortesia de Gláucio Dettmar/Agência CNJ)
Daniel Issler, juiz auxiliar da presidência do CNJ: “A prevenção é a saída. Precisamos mostrar que o crack é devastador”. (Cortesia de Gláucio Dettmar/Agência CNJ)
A experiência fez o especialista desenvolver um método de trabalho diferenciado, que agrega arte, terapias corporais e a profissão de palhaço para conquistar a confiança e o vínculo com os pacientes na área da saúde mental.
Em 2006, Falcone criou a Associação Amargen, onde atua juntamente com uma equipe de profissionais de várias áreas. Eles visitam as casas dos pacientes, oferecem atendimento em terapia corporal, promovem oficinas de artes e palhaço, além de montar espetáculos teatrais para os dependentes químicos.
Os resultados obtidos até agora são animadores, diz Falcone.
Dos pacientes que recebem arte, psicoterapia e medicação, 45% permanecem no tratamento – índice cai para 6,6%, quando a fórmula inclui apenas psicoterapia e medicação.

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